O técnico do Botafogo Paulo Autuori criticou dirigentes por cogitarem a volta do futebol durante a pandemia do novo coronavírus. Segundo o treinador, a atitude representa uma falta de respeito aos profissionais envolvidos na indústria do futebol.
— Me parece uma sandice discutir volta ao futebol, dirigentes e pessoas responsáveis pela gestão do país mostrando total falta de respeito com a quantidade de mortos. É muito duro para nós, que sabemos que é a rotina, perceber que eles não têm a menor noção e não dão a mínima para os profissionais. Não existe qualquer engrenagem que funcione sem as pequenas peças. As pessoas não estão sendo respeitadas por esses pseudo-dirigentes. Eu espero que os diferentes segmentos profissionais entendam. Nós temos algo a falar!
— O desespero de não estar tendo futebol, gera algumas coisas. Por exemplo, jogos que são retransmitidos e não geram nada para os clubes. Você conta nos dedos a capacidade que os dirigentes têm de não terem coragem de botar as coisas como deveriam ser. Nós temos uma palavra a dizer também. Não basta os dirigentes quererem que volte, a sandice de voltar agora sexta-feira, como foi colocado. Futebol é vida e não existe vidas sem pessoas.
Não por acaso, Autuori evita projetar o futuro do Botafogo e do futebol. Para o profissional, a preocupação global deve ser superar o momento delicado causado pelo vírus.
— O momento é de pensar nas vidas. Qualquer projeção pós-pandemia passa por aí: tentar entender como vamos conseguir, de uma forma global, ultrapassar esse momento tão difícil. É um grande desafio. Sou meio cético quanto às diferenças que a doença trará. Algumas pessoas serão diferentes, de fato. Pós-pandemia, no entanto, outras voltarão a reproduzir as mesmas características. Me refiro ao futebol e uns dirigentes. Já há fragilidade na maior parte dos clubes. Vi duas ações espetaculares, da federação argentina e da mexicana. Elas simplesmente definiram que não haverá ter acesso e descendo durante um período para que os clubes possam se organizar no mais alto nível competitivo – disse em entrevista ao “7Braga TV”
Veja os principais trechos da entrevista de Autuori:
Diversidade no futebol
— Respeito aos processos lá fora que aqui nós não temos. É evidente. O que me deixa bastante incomodado é a falta de respeito que existe por parte de alguma imprensa, e acima de tudo a hipocrisia que essa mesma parcela age. No dia a dia, eles pregam a diversidade. “Como é bonito a liberdade de expressão, de cada um ser o que é”, do que seja. Eles defendem isso.
— Mas quando entra no futebol, eles estão praticamente criando uma ditadura de você só ter que trabalhar de uma maneira. Enfim, isso é hipocrisia. Essa diversidade se faz presente também no futebol. Quantos profissionais trabalham de maneiras diferentes e são campeões? Nós já tivemos vitórias que foi possível por um detalhe, assim como as derrotas. O Guardiola, por exemplo, falou exatamente isso. São circunstâncias, nós temos que entender isso e respeitar o trabalho de cada um. Afinal, o futebol é vida. Existem dirigentes que estão na contramão do que está acontecendo no futebol. Não existe futebol sem vida. Certamente qualquer vitória em 2020 vai ser menor do que as derrotas que tivemos. A minha preocupação é essa. Nós somos privilegiados que chegamos nos nossos carros. E os outros clubes, em que os atletas usam transporte público?
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Gestão
— Fundamental quando você trabalha com um grupo de pessoas. Aqui no futebol temos a mania de rotular tudo e todos. ‘Precisamos de um treinador linha dura’, por exemplo. Não existe isso. Tem muitos treinadores com qualidade, competência que podem ter dificuldade na gestão do grupo. Quando isso acontece, é difícil fazer com que os jogadores acreditem nas ideias. Por isso, é preciso saber trabalhar as duas coisas.
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Libertadores
— Ganhar uma Libertadores é todo um processo de fortalecimento durante toda competição. No Cruzeiro, por exemplo, assumi no avião para o Peru. No primeiro turno da fase de grupo, tinha zero pontos e o jogo decisivo era contra o Grêmio. E a equipe ganhou ali. A partir dali, as coisas aconteceram. Tudo passa por gestão de grupo e estratégia.
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Cenários do Botafogo 1995 x 2020
— A história de 1995 é complexa. O futebol ainda é um jogo e, como tal, a sorte é fundamental. Foram seis meses e conseguimos um título que era inesperado. As comparações são odiosas. Não gosto de comparar porque o contexto é distinto, as pessoas são diferentes. São momentos distintos. Mas toda campanha vitoriosa começa com as dificuldades e administração delas. O grupo de 1995 era extremamente forte mentalmente. O protagonismo no futebol é exercido por duas pontas: jogadores e público. Nós, como treinadores, temos que fazer os jogadores acreditarem no que pensamos. É importante ter um grupo forte mentalmente, com capacidade técnica e competitiva.
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Retorno ao Botafogo
— O que seria de mim sem que o Botafogo tivesse aberto as portas? O Clube abriu as portas quando eu não era nada. O Botafogo, hoje, quer passar por uma nova etapa, virar empresa. Infelizmente, no entanto, o momento hoje atrasou um pouco as coisas, mas esse é objetivo do Clube. A ideia inicial é contribuir, num primeiro momento, como treinador. Na minha cabeça não passava treinar time. E certamente isso ainda está dentro de mim. Isso é apenas um momento, uma etapa que tenho que dar uma contribuição a uma instituição que para sempre vai estar no meu coração.
Foto: Vítor Silva / Botafogo
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