Desde junho, quando da apresentação do estudo encomendado pelos irmãos Moreira Salles à Ernst & Young, o Botafogo caminha para virar empresa. A mudança tem entusiasmado torcedores ilustres, como o Diretor-Executivo do IBOPE Repucom, José Colagrossi, que não esconde a ansiedade pela Botafogo S/A.
Nas redes, o diretor do IBOPE tem interagido com os botafoguenses e se posicionado sobre o processo da profissionalização do Clube.
Com exclusividade, José Colagrossi conversou com o Fogo Na Rede e tratou sobre Botafogo S/A a partir da perspectiva do marketing, sua especialidade.
Confira a íntegra da entrevista:
Sem a generosa receita estatal da Caixa, muitos clubes se viram em dificuldades para fechar com um patrocinador master. Outros optaram pela nova oportunidade de mercado: os bancos digitais, que por sua vez exigem metas de retorno para aumentarem a receita de patrocínio. Ou seja, tal qual as cotas de TV hoje, são receitas variáveis. Esta é uma tendência do mercado de patrocínio daqui para frente?
— A saída da Caixa abriu espaço para diferentes modalidades de parcerias de patrocínio, o que é benéfico como um todo para os clubes e patrocinadores. O patrocínio atrelado a vendas, uma destas novas modalidades, pode ser muito interessante se o clube souber, através de ações de ativações, impactar as vendas do produto, promovendo-o. Agora, é importante frisar que vendas também dependem de uma série de variáveis totalmente fora do controle do clube, como por exemplo economia, competição, mercado, distribuição, qualidade do produto ou serviço sendo oferecido, preço etc. O importante nestes casos é que tanto clube quanto patrocinador entendam as responsabilidades de cada um e tenham condições de executar o plano proposto.
Sem patrocinador master desde a saída da Caixa, o Botafogo teve oportunidade de fechar com bancos digitais, mas não aprovou o modelo – que a partir de agora demanda esforço do Clube para converter a ativação da marca em vendas. Esta decisão do Botafogo, na contramão do mercado, é justificada pelo cenário ainda amador vigente no Clube?
— Eu não trabalho no clube e não tenho detalhes destas negociações ou das razões que fizeram o clube rejeitar esse modelo de patrocínio. Portanto, não posso opinar especificamente sobre o esforço comercial do clube. Agora, se o clube rejeitou esse modelo por achar não ter condições de converter a ativação em vendas, foi então uma atitude correta.
Mensalmente, a IBOPE Repucom divulga um ranking digital dos clubes brasileiros. Na lista, o Botafogo é apenas o 13º colocado – atrás de todos os rivais do Rio. Para o mercado hoje, qual o peso destes números sob a perspectiva de obtenção de novas receitas?
— Certamente da maior importância. Patrocinadores desejam visibilidade e engajamento, que levam à construção de marca que eventualmente resultam em novas vendas. Engajamento acontece, em grande parte, no mundo digital. Por isso todos clubes devem investir no digital para se aproximar, assim como seus patrocinadores, dos torcedores.
O Botafogo caminha para se tornar empresa e, por consequência, profissionalizar sua gestão. Nesta nova realidade, o que muda para o Clube em termos de gestão de entretenimento esportivo e marketing?
— Não posso falar pelo clube nem pela equipe que lidera esse processo pois não sou parte formal deste esforço. Colaboro apenas como torcedor. Entretanto, falando genericamente sobre gestão de futebol como um todo, posso afirmar que a diferença entre o profissional e o amador é a diferença entre o bem feito e o feito mais ou menos. Digo sempre aos meus alunos na ESPM, Trevisan e Insper, que o único “amador” que teve sucesso consistente no Brasil foi o Amador Aguiar, fundador do Bradesco.
Nas redes sociais você se mostra bastante entusiasmado com a nova possibilidade do Botafogo virar clube empresa e chega a falar em “salvação”. Como torcedor, o que você projeta para o Clube a partir da profissionalização?
— Entendendo que seria um trabalho de longo prazo, projeto estar de volta ao futuro. Além disso, projeto o fim deste ciclo de derrotas, fracassos, frustrações e apequenamento que dominou a história do clube neste século. Não existe plano B. Enfim, ou fazemos isso ou iremos virar um América, com todo o respeito ao Mequinha, claro.
A torcida não está se renovando, estamos ficando acostumados à mediocridade, a torcida sempre é para não cair, e a indignação fica cada vez mais contida. Portanto, falo de “salvação” com enorme preocupação mas responsabilidade na minha afirmação.
Ainda que a participação dos Moreira Salles não esteja garantida, qual o peso do nome deles para o mercado?
— Deram credibilidade ao processo em seu início. Seremos sempre gratos a eles.
Dado todo o seu conhecimento na área, você está contribuindo ou foi procurado para contribuir profissionalmente neste processo de reestruturação do Botafogo?
— Colaboro como torcedor como posso. Recentemente, por exemplo, lancei uma campanha no meu Twitter para que a torcida gere conteúdo positivo nas mídias sociais, sempre difícil, entendo, quando o clube perde vários jogos seguidos.
Com a crise econômica, profissionais do jornalismo estão migrando para a internet com canais próprios ou veículos independentes – alguns se antecipando à demissão, outros pela liberdade. Dentro de uma gestão profissional, como os profissionais independentes devem ser vistos pelos Clubes?
— Como uma excepcional oportunidade de parceria midiática. Então, veículos independentes, como esse, permitem ao clube gerar conteúdo de qualidade e engajador com agilidade e eficiência.
Em 2018, você fez uma análise do patrocínio de camisa nos grandes clubes da América Latina e observou que grandes marcas, como Coca Cola, Kia e Qatar Arways, por exemplo, não estão aqui por inúmeros fatores. Acredita que em 2019 estas marcas podem entrar no futebol brasileiro? E, assim sendo, o modelo tende a ser o dos bancos digitais, com receitas variáveis a partir de metas de retorno?
— O novo mercado de patrocínio esportivo suporta modelos diferentes, que vão do tradicional, baseado em construção de visibilidade, ao modelo de verba por vendas. Isso é positivo pois permite que mais empresas possam entrar no mercado.
Espero que marcas que patrocinam futebol na América Latina, mas não no Brasil, voltem ao mercado nacional a partir de 2020.
Mas para isso, os clubes têm que saber construir propostas de parcerias comerciais que façam sentido. A época da “Sua Marca Aqui” numa apresentação em PowerPoint acabou. Clubes que não se adequarem à nova realidade do mercado de marketing esportivo vão acabar juntos. Espero, torço, rezo, e faço o que posso para que o nosso Glorioso não seja um destes.
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